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REVISTA DA MADEIRA - EDIÇÃO N°79 - MARÇO DE 2004

Manejo

Sustentabilidade florestal brasileira

Sabe-se que somente 4% das florestas produtivas tropicais, recebem algum tipo de exploração florestal regulada ou tratamento silvicultural. Isto ocasiona confusão na opinião pública, que não diferencia o manejo de exploração não regulada, sendo, talvez, um dos principais argumentos dos conservacionistas contra o manejo florestal.

Outra dúvida, esta sim já mais complexa e pertinente, seria se mesmo sob adequado manejo florestal (com as técnicas atuais e o correto controle) a sustentabilidade estaria garantida. Estudiosos asseguram que não é possível demonstrar conclusivamente que alguma floresta tropical, para produção madeireira foi manejada com sucesso, pois a resposta rigorosa é possível somente, depois da terceira rotação. A primeira rotação não serve de base para avaliar qualquer declínio posterior. Além disso, a taxa anual de corte, sofrerá provavelmente redução, uma vez que o incremento não será o mesmo dos anos anteriores.”

Estimativas apontam que a produção das florestas da Amazônia, no futuro conterão árvores de espécies desejáveis com diâmetro menor do que 70cm, e que isto entretanto resultará positivamente facilitando a organização dos trabalhos de exploração florestal.

Os 20 anos de pesquisa em manejo de floresta tropical da EMBRAPA/CPATU são base para autores do setor afirmarem que as limitações do manejo florestal são apenas de ordem econômica , social e institucional e não mais de ordem técnica.

Principais limitantes

Além do tema sustentabilidade, outros fatores não técnicos concorrem para dificultar a real implementação do manejo madeireiro são por razões financeiras, ambientais, sociais e por dificuldade no controle e fiscalização.

Com relação aos motivos financeiros, pode-se dizer que as escalas de tempo das rotações e taxas utilizadas são inadequadas para a viabilidade do manejo madeireiro. O custo do manejo florestal, ainda não é admitido e considerações sobre escassez e dispersão da espécie de interesse são negligenciadas. Sendo assim, as florestas são subvalorizadas. Se não é considerado o “custo do manejo”, o produtor abandona as práticas sustentáveis de manejo florestal. Isto refletiria diretamente nas razões ambientais, pois haveria perda do potencial de diversidade da floresta manejada.

Quanto aos motivos sociais, este tipo de manejo poucas vezes envolve as populações marginais e as estradas de acesso, sendo muitas vezes um estímulo para a invasão, em busca de áreas para a produção de alimentos.

A respeito do controle, as instituições de controle não estão capacitadas atualmente para proteger as áreas manejadas, de invasão, ou avaliar a adequada exploração e tratamentos silviculturais, seja por falta de equipamentos adequados, pessoal treinado, ou mesmo sistemas de monitoramento. Ainda devem ser citados a falta de uma política nacional para evitar que áreas potencialmente florestais sejam convertidas para outros usos e por último falta de pessoal técnico qualificado.

Alternativas

Possivelmente, de acordo com a região, uma melhoria significativa na transformação, pode ser um dos primeiros passos para a viabilização do manejo madeireiro agregando um maior valor aos produtos madeireiros.

Outra sugestão seria considerar diferentes tipos de manejo, baseados no custo dos tratamentos silviculturais e seu percentual de intervenção.

Áreas permanentes de manejo devem ser definidas por um rigoroso macro zoneamento evitando o confronto com atividades potencialmente inadequadas para estas regiões. As populações vizinhas a qualquer área florestal manejada devem ser envolvidas no processo.

Eficientes serviços florestais devem ser desenvolvidos para o perfeito controle e fiscalização das manejadas. As técnicas atuais de manejo garantirão a manutenção de grandes áreas sob cobertura florestal, valorizando a floresta tropical úmida, enquanto a pesquisa avança no seu aperfeiçoamento.

Além disso, é importante enfatizar que muitos trabalhos tem sido realizados visando definir, um sistema silvicultural brasileiro. Os resultados das pesquisas na Floresta Nacional do Tapajós em resumo definiram o seguinte sistema: exploração de no máximo 40 m³/ha; abate direcional; inventário a 100%; liberação das árvores para o ano seguinte; monitoramento mediante parcelas permanentes; tratamentos silviculturais a cada 10 anos.

Com este sistema, é esperada uma produtividade em torno de 2 m³/ha/ano, com um ciclo de corte estimado de 30 anos.

Manejo de uso múltiplo

Como manejo de uso múltiplo entende-se, principalmente, o manejo conjunto dos principais produtos que a floresta pode oferecer. Este conceito está intimamente ligado com o plano de uso da terra. Neste caso, considera-se todas as alternativas possíveis de possibilidade de administração dos recursos da floresta, como produtos madeireiros e não madeireiros em conjunto, produção de alimentos, turismo, proteção da vida silvestre, água, e outros.

Manejo de uso múltiplo é o manejo dos vários recursos da superfície das florestas de modo que elas sejam utilizadas em uma combinação que melhor atenda as necessidades das populações, fazendo o mais sensato uso da terra. Entretanto, para esta condição de manejo, existe a necessidade de forte sistema e critérios de gerenciamento dos produtos.



Área habitada



O manejo florestal deve ser adaptado não apenas as características das florestas também as características das populações que habitam estas florestas. Assim, as estratégias para intervenção em áreas despovoadas devem ser diferenciadas para as florestas ocupadas por populações tradicionais. Normalmente os planos de manejo madeireiro são planejados para áreas sem população ou no mínimo desconsiderando as mesmas. Todos os planejamentos consideram apenas técnicas adequadas a extração propriamente dita.

Neste caso, O Estado do Acre é um exemplo de situação em que a floresta tropical encontra-se densamente povoada. Neste tipo de manejo, há necessidade de identificar a forma de retorno, do valor da madeira explorada para a população a nível individual. As cooperativas e associações terão papel importante.

Na parte relativa à implementação, o lançamento das estradas, compartimentos e pátios de estocagem devem ser repensados. Os efeitos na caça de subsistência devem ser avaliados.

A existência de população na área pressupõe anterior atividade coletora desta comunidade, o que implica em cuidados nos planejamentos de abate e extração. Na Floresta Estadual do Antimari, por exemplo, caracteristicamente uma área de produção de borracha e castanha estes cuidados foram tomados. Cada família controla 300 ha que são tornados acessíveis por caminhos. A distribuição irregular destes caminhos, a distribuição das árvores de borracha, castanha ou outras plantas alimentícias não favorecem a divisão em compartimentos e rede de estradas segundo a prática de manejo normal.

Assim, a área de moradia e atividade do seringueiro foi considerada a unidade básica de produção e toda planificação feita neste sentido. As taxas de extração foram bem abaixo da realizada em florestas que só possuem a função de extração madeireira e de acordo com a tipologia florestal. O pessoal local foi treinado também em técnicas de exploração cuidadosa para o povoamento remanescente.



Condições gerais



Para realizar o manejo florestal é preciso considerar alguns fatores, tais como zoneamento, ambiental, social, pesquisa e custos do manejo.

Talvez o zoneamento seja o principal requisito e o de mais difícil compreensão. O conceito de zoneamento em regiões de floresta tropical úmida é (ou deveria ser) completamente diferente do puro conceito de zoneamento agronômico. O zoneamento deve partir do ponto de vista das variáveis da floresta. Neste caso, a existência de população na floresta, por exemplo, já deve ser considerado como uma nova variável (a existência de áreas com atividades extrativistas é outro exemplo de fatores que devem ser imediatamente assimilados).

Outras variáveis ou utilizações da floresta (produção madeireira em áreas para isso determinadas, reservas biológicas, corredores, áreas de produção de alimento, etc) devem ser considerados, sem necessariamente, se opor entre si.

O Zoneamento deve considerar a macro distribuição espacial destas áreas transcendendo fronteiras de estado ou país. A produção madeireira, de maneira geral, deve localizar-se somente em áreas permanentes de manejo florestal madeireiro. Qualquer possível combinação entre os diferentes tipos de manejo madeireiro e de uso-múltiplo, diz respeito a análise e decisão das próprias comunidades moradoras de áreas florestais. No caso das reservas extrativistas alguns pesquisadores defendem a extração madeireira sob manejo sustentado salientando, entretanto, que a produção madeireira para comercialização, requer um nível de organização social elevado e regularização da estrutura fundiária, para impedir que ela resulte em saque às reservas extrativistas. É claro que a opção por mais este recurso diz unicamente respeito ao extrativista.

Após esta macro distribuição espacial, entre os vários usos da floresta tropical, sem dúvida o papel dos corredores e seu levantamento e planejamento, tem crucial importância. Deverão ser planejados de maneira a diminuir a fragmentação das áreas sob cobertura. Eles serão fundamentais para facilitar o movimento da fauna, concorrendo para dar suporte a diversidade biológica.

Após a quantificação, qualificação, planejamento e distribuição de todas estas macro áreas de uso da floresta, outras atividades podem ser então definidas.



Ambiental



Os requisitos ambientais não podem ser estudados em separado. O caso do correto zoneamento abordado anteriormente, refletirá positivamente sobre o item ambiente. O impacto do manejo madeireiro deve ser avaliado e pode ser reduzido mediante práticas adequadas e também localizado de acordo com as áreas especificas para manejo madeireiro segundo zoneamento.

Entretanto, se deverá admitir, que nas áreas destinadas a manejo, a manutenção completa da diversidade, jamais poderá ser garantida. Por isso em cada caso de ecossistema pode-se indicar, através de estudos, qual o índice suportável. Além disso, uma política de estudo exaustivo das diversidades regionais e criação de modelos de monitoramento, podem ser implementados unindo entidades de pesquisa. É claro que projetos assim deverão contar com o total apoio dos governos e estas linhas de pesquisa serem identificadas como prioritárias e transcenderem os mesmos.



Social



Uma das principais causas da falha em todo mundo dos planos de manejo é a incapacidade dos responsáveis pelo manejo em controlar o uso da terra, mesmo em áreas que outros pré-requisitos como a regeneração após o corte é adequada.

A invasão das áreas sob manejo sustentado após o primeiro corte é uma constante em vários países tropicais. A própria estrada florestal torna-se um fator importante de acesso a estas áreas.

A sustentabilidade das florestas passa pela estabilização das populações vizinhas a estas. Qualquer exame superficial da causa dos desmatamentos passa pela questão de pobreza do III Mundo. Deve ser lembrado que os estímulos dado pelos governos à áreas tropicais, classificando as principalmente como fronteira agrícola, tem maior influência nos desmatamentos.



Pesquisa



Não existem ainda modelos de manejo verdadeiramente tropicais e os atuais seriam adaptações do manejo florestal de áreas temperadas. Deve-se considerar a necessidade de novos conceitos ou modelos de manejo florestal mais adaptados a floresta tropical úmida. A partir das experiências já realizadas é preciso viabilizar a replicação destas pesquisas em vários pontos da Amazônia. Considera que existem áreas na Amazônia sem regeneração satisfatória, portanto experimentos e pesquisas na floresta tropical devem ser iniciados e diferentes métodos e técnicas devem ser testados.

A possibilidade da perfeita combinação no manejo de produtos madeireiros e não madeireiros deve ser perseguida não só em projetos de pesquisa, mas associando-os a projetos de implementação real. O envolvimento de populações

da floresta e pequenos e médios produtores é fundamental. Um nível suportável de diversidade biológica deve ser garantido. Qual o nível e como mantê-lo é função da pesquisa determinar para garantia inclusive da sustentabilidade do sistema.

As instituições de pesquisa da Amazônia nacional e internacional devem criar um pólo de pesquisa que possibilite o suporte a planos reais de manejo florestal em diferentes tipologias florestais e ambientais.

A manutenção das linhas de pesquisa e a formação de pessoas tecnicamente capacitadas em floresta tropical também dois fatores importantes a considerar. Entretanto, um fator importante a ser considerado é a falta de financiamento adequado para a pesquisa florestal (em torno de 0,05 a 0,12 % do valor dos produtos florestais) e isto é uma constante para todo o mundo tropical.



Custo do manejo



Existem custos e taxas adequadas às rotações ou ciclos de corte. Custos estes compostos de todas as atividades de planejamento, implementação de rede de estradas, logística, exploração, tratos silviculturais, transporte final entre outros. Mais tarde identificando o real valor da floresta de acordo com suas espécies.

Além disso, o mercado nacional ou internacional não reconhece ainda a diferença entre madeira produzida com ou sem sustentabilidade, tornando o preço da primeira muito abaixo para remunerar os custos de sua produção.

Para o manejo sustentado é importante a escolha adequada da taxa interna projetada durante o período e ainda a importância de se considerar os benefícios dos produtos sem remuneração (qualidade da água, microclima, conservação do solo e ouros.

Outro fator é o número de espécies com mercado garantido. Um maior número de espécies com mercado, proporcionará recursos mais concentrados, necessitando poucos metros lineares de estrada por metro cúbico de madeira. As espécies devem ser oferecidas no mercado externo ou interno por grupos com as mesmas qualidades tecnológicas e uso final.

A adaptação de mecanismos de financiamento dos planos, adequados a duração dos ciclos biológicos florestais são indispensáveis a concretização do manejo sustentável.



Vantagem do manejo



Atualmente a maior parte dos planos de manejo em floresta tropical no Brasil, tem função meramente burocrática ou de “aval”. Ou seja, depois de preenchidos os requisitos exigidos pelo órgão controlador, sua implementação efetiva, como os tratamentos silviculturais necessários, planejamento da rede de estradas, compartimentos ideais, não passa para a realidade.

Muitas vezes quem elabora os planos de manejo, desconhece (ou prevê) a realidade futura, quando da implementação destes, no campo. Existem planos de manejo forjados em dados de outros levantamentos. Normalmente estes apresentam custos muito abaixo do esperado, pois não foram executados todos os levantamentos necessários.

Existem “indústrias de planos de manejo florestal” completamente dissociados da realidade, buscando apenas a aprovação no órgão competente.

Existe, ainda, a necessidade de formação de profissionais qualificados para pesquisa em manejo sustentado devido a escassez de pessoal nessa área com a devida formação.



Evaldo Muñoz Braz Engenheiro Florestal, EMBRAPA

Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária

CPAF-Acre Apartado aéreo 392, Rio Branco, Acre, Brasil

Santa Cruz de la Sierra, Bolivia, 15-20 de Julio de 1997